quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Agricultura do Egito

Agricultura do Egito
 

Na descrição da agricultura irriga da egípcia a primeira coisa que deve ser esclarecida é que suas condições eram diferentes das que imperavam na Mesopotâmia. A inundação anual do Nilo é muito menos violenta do que a dos rios Tigre e Eufrates, e também muito mais regular em sua data. Além disto, começa em julho, e a retirada das águas, em fins de outubro, coincide com o momento adequado para semear. Depois, entre a colheita e a nova inundação, passam-se vários meses, permitindo a limpeza e conserto dos diques e canais. Depois que o cereal é segado, o solo dos campos se torna seco e se fende, ficando pronto para ser penetrado em profundidade pela água e pelos aluviões fertilizantes da inundação. Assim, não são necessárias no Egito as importantes obras de proteção contra a cheia fluvial imprescindíveis na Baixa Mesopotâmia. Por outro lado, os meses mais quentes coincidem com o período em que a terra arável está coberta pelas águas da inundação; nos meses de seca - os menos quentes - a água do Nilo e dos reservatórios basta para regar campos e hortas. Em circunstâncias tão favoráveis, o sistema hidráulico de irrigação por tanques desenvolvido na Antigüidade foi bem mais simples do que o da Mesopotâmia. Eis aqui uma boa descrição:

“O sistema consiste em que a terra ao longo do rio fique dividida em compartimentos - tanques - por diques levantados em ângulo reto em relação ao curso fluvial; um canal iniciado a montante conduz a água do rio ao tanque, onde canais menores e valas a estendem uniformemente por todo o compartimento; outro canal recolhe o excesso de água e o leva a um segundo tanque, ou então de volta ao rio, a jusante. A irrigação de tanque só pode produzir uma colheita por ano, porque, quando o rio desce abaixo de certo nível, os canais que alimentam os tanques secam. Mas, com o rico solo do Egito, uma colheita é o bastante, e o sistema tem a vantagem de canais curtos, da fácil manutenção e lenta obstrução dos canais pelos sedimentos. Isto significa que cada aldeia era economicamente independente; ao passo que o trabalho necessário para obtenção de um excedente de alimentos estava folgadamente ao alcance de uma pequena unidade social, deixava realmente uma boa quantidade de tempo livre e permitia a especialização artesanal.” (L. Woolley, “Los comienzos de la civilización”, in J. Hawkes e L.Woolley, História de la Humanidad. Desarrollo cultural y científico, tomo I, Buenos Aires, Editorial Sudamericana, 1966, p. 489.)

Os trabalhos recentes mostraram que o sistema egípcio de irrigação por tanques tinha um caráter local a princípio: não há qualquer prova de uma administração centralizada de redes de irrigação até o Reino Médio, isto é, até mil anos depois da unificação do reino egípcio. Nestas condições, tudo indica que o papel da agricultura irrigada foi enorme na formação e consolidação das confederações tribais que deram origem, em cada região do país, ao spat (mais conhecido pelo termo grego “nomo”), que no reino unificado funcionou como província; o Egito antigo compreendia cerca de quarenta nomos. A irrigação não pode, porém, ser vista como a causa do surgimento do Estado centralizado e da civilização egípcia: pelo contrário, um sistema centralizado de obras hidráulicas para a agricultura irrigada surgiu como um resultado tardio da existência de um Estado forte. Note-se que o abandono da “hipótese causal hidráulica” não significa que a irrigação não fosse muito importante. E, inclusive, uma vez instalado um sistema planejado e centralizado de irrigação, mesmo tardiamente, nas novas condições o controle institucional unificado da rede de canais e diques acabou por transforma-se em algo necessário: sua ausência poderia agora provocar uma catástrofe econômica, já que se tornara difícil voltar à descentralização anterior. Por outro lado, a crítica a uma causalidade única ou linear baseada na “hipótese hidráulica” não quer dizer que, abandonada esta, seja impossível integrar a irrigação como um fator entre vários outros, em modelo causais mais amplos.

A que atribuir, então, a unificação do Egito? Existem muitas teorias a respeito, difíceis de avaliar em virtude da escassez de dados e fontes. Muitas das tentativas contemporâneas de explicação (L. Krader, B. Trigger, R. Carneiro) enfatizam fatores ligados à guerra, à conquista, ao militarismo. Seja como for, tudo indica que o processo de formação do Egito como reino centralizado dependeu de numerosos fatores – demográficos, ecológicos, políticos etc. -, entre os quais a irrigação, pelo menos indiretamente, foi elemento de peso.
ECONOMIA E SOCIEDADE

As técnicas de produção utilizadas pelo Egito faraônico se fixaram na sua maioria - como ocorreu na Mesopotâmia - durante o surto de inovações tecnológicas que se estende aproximadamente de 3200 a 2700; depois houve algumas invenções isoladas e aperfeiçoamentos, mas não qualquer mudança radical do nível tecnológico. A comparação do Egito com a Mesopotâmia levará, porém, a constatar certo atraso do primeiro em relação à segunda: o nível técnico geral era mais baixo no Egito, e os egípcios demoraram mais a adotar certas inovações há muito introduzidas na Mesopotâmia. Assim, a substituição do cobre pelo bronze em escala apreciável só ocorreu durante o Reino Médio, um milênio depois da Baixa Mesopotâmia. Por outro lado, o metal levou muito tempo para substituir a madeira e a pedra na fabricação da maioria das ferramentas: isto só aconteceu de maneira significativa com a difusão do ferro, já no I milênio. Os instrumentos de metal eram tão caros e valiosos que os seus donos os marcavam com o seu sinete, após pesá-los, antes de entregá-los aos trabalhadores. O torno para fabricação de cerâmica usado no Egito foi, durante séculos, mais lento e ineficiente do que era empregado na Mesopotâmia. O shaduf- instrumento simples, baseado no princípio do contrapeso, para elevação de recipientes com água - só foi introduzido no séc. XIV, enquanto aparece em um sinete mesopotâmico uns seiscentos anos antes.

Tudo isto não justifica, porém, que se fale em “estagnação tecnológica”, e menos ainda que sejam propostas teoria simplistas (como a de William C. Hayes há algumas décadas) a respeito de uma “psicologia egípcia” marcada pela falta de espírito inventivo, da qual resultaria que o Egito se limitasse a receber passivamente sucessivos empréstimos tecnológicos provenientes da Ásia Ocidental. É possível que a idéia da agricultura e a da escrita tenham vindo ao Egito da Mesopotâmia: mas as soluções egípcias dadas a estes e outros problemas foram extremamente originais, e hoje já não se aceita a hipótese de uma origem asiática da civilização egípcia. Quanto à questão da “estagnação tecnológica”, afirmar que ocorreu no Oriente Próximo pelo fato de haver este conhecido um surto de inovações seguido por séculos de difusão e aperfeiçoamento sem mudança radical, implica duas posições metodologicamente ilegítimas: 1) a identificação do progresso técnico exclusivamente com a invenção; 2) comparações históricas com o mundo contemporâneo. Por que, por exemplo, só mencionar os períodos em que novas invenções são introduzidas, e deixar de abordar o que significou para o Egito faraônico a extensão das forças produtivas disponíveis à região do Fayum a partir do Reino Médio, fazendo surgir toda uma nova zona agrícola? Por outro lado, a introdução permanente ou ininterrupta de tecnologia só ocorre, em toda a história humana, sob o capitalismo altamente desenvolvido. Em todas as sociedades pré-capitalistas, o que temos são fases de “revolução tecnológica”, de surgimento de nova tecnologia, às quais se seguem períodos mais ou menos longos em que o novo nível técnico é explorado e aperfeiçoado, e se estende a novas regiões. A origem da idéia de uma estagnação tecnológica “oriental” vem de uma projeção sobre o passado de comparações feitas entre a Europa já industrializada e países como a Índia ou a China no século XIX de nossa era. Ora, comparações entre sociedades situadas em pontos extremamente diferentes de evolução econômico-social carecem de sentido, são metodologicamente inaceitáveis.
 
As atividades agrícolas eram o setor fundamental da economia agrícola antiga. Nós as conhecemos bem, do ponto de vista da descrição, em virtude das copiosas cenas representadas nas pinturas e relevos murais das tumbas. A vida agrícola se desenvolvia segundo um ciclo bastante curto, se considerarmos as produções básicas - cereais (trigo duro e cevada em especial) e linho - , em função das três estações do ano que eram típicas do país: a inundação (julho-outubro), a “saída” ou o reaparecimento da terra cultivável do seio das águas, época da semeadura (novembro-fevereiro), e a colheita (março-junho). Com a paralisação das atividades agrícolas durante a inundação, e considerando-se que a colheita, realizada em abril e maio, terminava bem antes que ocorresse a nova cheia do rio, vemos que o ciclo da agricultura básica durava pouco mais de meio ano apenas. Isto quer dizer que era possível dispor de abundante mão-de-obra para as atividades artesanais da aldeia, para trabalhar nas instalações de irrigação, e para as grandes obras estatais (templos, palácios, sepulcros reais, monumentos diversos).

Em certos casos, a semeadura era realizada antes que as águas se retirassem totalmente, no barro semilíquido, fazendo-se que o gado menor (ovelhas, cabras, porcos) passasse sobre o campo para enterrar as sementes. Se quando se semeava a terra já estava seca, o arado e a enxada serviam para recobrir o grão. A enxada também servia para quebrar os torrões de terra; para tal às vezes se usava igualmente uma espécie de malho. Tanto o arado quanto a enxada egípcios eram instrumentos muito simples e leves de madeira. Como entre a semeadura e a colheita se passavam de quatro a cinco meses, durante os quais os campos dispensavam maiores cuidados e a umidade proveniente da última inundação era suficiente, os camponeses podiam se dedicar a cultivos mais intensivos, que exigiam irrigação permanente, até o Reino Novo transportando água em vasilhas dependuradas numa vara, e depois do século XIV utilizando o já mencionado shaduf. Assim era praticada a horticultura, sendo produzidos alho, cebola, pepino, alface e outras verduras e legumes; também eram plantadas árvores frutíferas, e videiras. Várias plantas (como o sésamo) eram cultivadas para obtenção de azeite; o azeite de oliva era importado.





Chegando a época da colheita, os talos do trigo e da cevada eram cortados pelo meio com uma foice de madeira com dentes de sílex, enquanto o linho era arrancado. Depois o cereal era pisoteado pelo gado maior para separar o grão da palha, peneirado e guardado em celeiros de forma grosseiramente cônica (de fato, tinham a forma de pães de açúcar).

Os egípcios foram muito ativos nas suas tentativas de domesticação de animais até o Reino Antigo. Chegaram a experimentar domesticar hienas, antílopes, gruas e pelicanos! O gado maior – bois, asnos; o cavalo só se difundiu sob o Reino Novo – servia em primeiro lugar para puxar o arado, para separar os grãos da palha e para o transporte. O cavalo era usado para puxar carros, e não montado. Vacas e bois eram usados também para a alimentação (carne , leite) e sacrificados aos deuses. Os pastos se localizavam com freqüência nos pântanos ou seus arredores, sendo particularmente extensos no Delta. A umidade de tal ambiente não era propícia aos bovinos, razão pela qual o rebanho era renovado regularmente mediante importações de animais da Núbia e da Ásia. Tanto a criação de gado quanto a de aves (gansos, patos, pombos) eram feitas em duas etapas. Numa primeira fase, os animais viviam em liberdade; em seguida, alguns deles eram selecionados para a fase de engorda, durante a qual eram cevados, às vezes à força. O gado menor compreendia ovelhas, cabras e porcos. Só no Reino Médio foi introduzido um tipo de carneiro cuja lã era utilizável, mas de fato quase não foram achados exemplos de tecidos de lã, sendo o linho a base da vestimenta. A diminuição do número de representações pictóricas relativas á criação de gado durante o Reino Médio levou a que certos autores afirmassem ter ocorrido então sua diminuição, à medida que as terras cultivadas se estendiam às expensas das antigas pastagens.

A agricultura e a criação eram complementadas pela pesca – importante apesar de certas limitações religiosas ao consumo de peixe - , praticada no Nilo, nos pântanos e nos canais com rede, anzol, nassa e arpão. Boa parte dos peixes era secada ao sol. Também a caça era praticada no deserto e nos pântanos, usando-se para tal o cão, o arco e o laço, e capturando-se aves selvagens com redes. Finalmente, as terras pantanosas eram zonas de coleta de papiro – para a alimentação e para produção de fibras de múltiplas utilidades. A coleta compreendia também a madeira de qualidade má ou média disponível no país (sicômoros, acácias, palmeiras etc.).

Não dispomos de cifras de população para o Egito faraônico. Para o período greco-romano, as estimativas baseadas em autores antigos (Diodoro da Sicília, Flávio Josefo) giram em torno de sete milhões de habitantes. Como no conjunto as técnicas ligadas à subsistência não eram muito diferentes na fase que nos interessa, talvez seja possível considerar tal cifra pelo menos como ordem de grandeza ou limite superior. Isto nos daria uma densidade de população (levando em conta somente as terras cultiváveis) de mais de 200 habitantes por km, muito elevada para a Antigüidade. O Egito era um dos “formigueiros humanos” do mundo antigo, em virtude da sua extraordinária fertilidade renovada anualmente pelos aluviões do Nilo. Sendo a vida agrícola inteiramente dependente da inundação, quando esta faltava ou era insuficiente ocorria a fome – apesar das reservas acumuladas pelo Estado – e morriam milhares de pessoas. Temos muitos documentos escritos (e às vezes pictóricos) que se referem a tais épocas calamitosas. Numa delas, durante o Primeiro Período Intermediário, segundo parece houve casos de canibalismo.

A atividade artesanal se desenvolvia, em primeiro lugar, em função das matérias-primas fornecidas pelo rio e pelas atividades agrícolas e de coleta: fabricação de tijolos e de vasilhame com argila úmida do Nilo, recolhida logo depois da inundação; fabricação do pão e da cerveja de cereais; produção de vinho de uva e de tâmara; fiação e tecelagem do linho; indústrias do couro; utilização do papiro e da madeira para produções diversas (material para escrever, cordas, redes, embarcações, móveis, portas etc.). Por outro lado, ao contrário da Mesopotâmia, o Egito dispunha, em terras submetidas à sua jurisdição direta – as colinas que bordam o vale do Nilo, o Sinai, o deserto oriental, a Núbia - , de rica provisão de pedras duras, usadas para vasos, estátuas, construções religiosas e funerárias, de pedras semipreciosas (turquesa) e de metais (ouro, cobre, chumbo). A madeira de boa qualidade para construção naval e para uso nos palácios e templos era, porém, importada (cedros da Fenícia, obtidos no porto de Biblos), como também a prata, o estanho necessário para o bronze, a cerâmica de luxo, o lápis-lazúli e outros artigos. O cobre era endurecido com arsênico, também importado. O artesanato egípcio organizava-se em dois níveis. Nas propriedades rurais e nas aldeias existiam oficinas que produziam tecidos grosseiros, vasilhas utilitárias, tijolos, artigos de couro, produtos alimentícios (pão, cerveja) etc. Já o artesanato de luxo, de alta especialização e qualidade excepcional – ourivesaria, metalurgia, fabricação de vasos de pedra dura ou de alabastro, faiança, móveis, tecidos finos, barcos, pintura e escultura etc. - , concentrava-se em oficinas mais importantes, pertencentes ao rei e aos templos. O monarca era também responsável pela organização da mineração e das pedreiras (exploradas através de expedições ocasionais) e pelas grandes construções e obras públicas.

As tumbas do Reino Antigo mostram o pequeno comércio local pela troca de produto por produto, e o pagamento in naturade vários serviços. Em transações maiores e para o cálculo dos impostos (que eram pagos em espécie), o padrão pré-monetário de referência eram pesos de metal (shat, deben). Embora existisse alguma especialização produtiva regional (a cidade de Mênfis concentrava a melhor metalurgia, o Delta era o principal centro pecuário e vinícola etc.), e o Nilo permitisse um tráfego intenso de embarcações, a circulação de produtos entre as diversas regiões do país fazia-se administrativamente, segundo parece, sob o controle de funcionários reais. Quanto ao grande comércio exterior, por terra e sobretudo por mar – com as ilhas de Creta e de Chipre, com a Fenícia, com o país de Punt (talvez a costa da atual Somália) - , para a importação de matérias-primas e artigos de luxo, tinha as mesmas características da mineração e das pedreiras: organizava-se sob a forma de grandes expedições ocasionais ordenadas pelo rei. Nos primeiros tempos inclusive inexistiram comerciantes particulares. Com as conquistas egípcias na Ásia Ocidental durante o Reino Novo, houve uma intensificação do comércio e surgiram comerciantes com alguma importância: mas o controle estatal sobre o grande comércio persistiu. De fato, tais comerciantes – localizados nos portos de Tebas, Akhetaton, Mênfis, Tânis – eram agentes estrangeiros (sírios) a serviço do monopólio comercial do Estado.

Assim, um dos traços mais visíveis da economia egípcia antiga era, sem dúvida, o estatismo faraônico: a quase totalidade da vida econômica “passava” pelo rei e seus funcionários, ou pelos templos. Estes últimos devem ser considerados parte integrante do Estado, mesmo se, em certas ocasiões, houve atritos entre a realeza e a hierarquia sacertotal; aliás, os bens dos templos estavam sob a supervisão do tjati, espécie de “primeiro-ministro” nomeado pelo faraó. As atividades produtivas e comerciais, mesmo quando não integravam os numerosos monopólios estatais, eram estritamente controladas, regulamentadas e taxadas pela burocracia governamental. Para fins do Reino Novo, um importante documento – o papiro Wilbour (XX dinastia) – mostra que Ramsés V, a semeadura da totalidade das terras reais e dos templos (ou seja, de parte muito considerável e talvez majoritária da superfície cultivada) era controlada administrativamente pelo governo central. Ao retirar-se a inundação, funcionários avaliavam a extensão efetiva de terras aráveis disponíveis naquele ano em cada campo submetido à autoridade de um administrador; levando em conta este dado e igualmente a mão-de-obra com que tal administrador podia contar, fixava-se a quota de grãos que se esperava do campo em questão para os celeiros públicos, distribuindo-se em função disto os sacos de sementes.

Seja em forma de colheitas, rebanhos, produtos artesanais e matérias-primas provenientes de seus próprios campos, oficinas e expedições de mineração ou comércio, seja na qualidade de impostos em espécie que taxavam a quase totalidade das terras e atividades; a maioria absoluta do excedente econômico disponível era cada ano concentrada pelo rei e pelos templos. Estes agiam, em seguida, como gigantescos mecanismos de redistribuição da riqueza assim concentrada: nos níveis superiores, fazendo viver uma aristocracia burocrática, sacerdotal e, no Reino Novo, também militar; nos níveis inferiores, remunerando o trabalho dos artesãos especializados e alimentando os trabalhadores que executavam as obras públicas. Um tal regime econômico, com a conseqüente dependência de comerciantes, artesãos e prestadores de serviços, não poderia ser favorável a uma urbanização comparável à da Baixa Mesopotâmia, onde a iniciativa privada tinha um campo de ação bem maior. Alguns autores (como John Wilson) sugeriram, mesmo, que até o Reino Novo o Egito teria sido uma civilização sem cidades. Isto pode ser um exagero, pois a verdade é que, nas maiores aglomerações (Mênfis, Tebas), os bairros residenciais, mercados, oficinas, construídos com materiais perecíveis (ao contrário dos templos de pedra), não deixaram vestígios que a Arqueologia possa estudar. Seja como for, no Egito um forte poder monárquico precedeu o pleno desenvolvimento da urbanização, da especialização ocupacional do comércio exterior da burocracia, e pôde assim manter tal desenvolvimento sob sua égide e controle.

No entanto, a afirmação – comum em obras antigas – de ser o rei o único proprietário das terras egípcias não é exata. Desde o Reino Antigo, ao lado das extensas propriedades dos templos, formadas por doações reais que, por outro lado, freqüentemente isentavam tais terras de impostos e seus habitantes de trabalhos forçados para o governo. Também achamos diversas gradações de propriedades privadas em mão de altos funcionários, algumas com caráter vitalício, outras transmissíveis hereditariamente; sua origem se prende ao exercício de funções públicas e à necessidade de manter o culto funerário. É verdade, porém, que todas as formas de propriedade existentes ao lado da do rei dependiam da aprovação do monarca (inclusive no caso de herança paterna ou materna). No Reino Novo, vemos uma extensão impressionante dos bens dos templos e a formação de uma classe de proprietários militares, beneficiários de concessões reais. Uma grande propriedade do antigo Egito não era em geral realmente extensa segundo padrões atuais: Metjen, funcionário graduado da IV dinastia, acumulou 125 hectares de terras, sendo 75 em propriedade e 50 em virtude do exercício de funções públicas. Por outro lado, as propriedades maiores não formavam blocos contínuos ou compactos: estavam dispersas em parcelas situadas em diferentes regiões do país, às vezes muito distantes entre si. Certos textos - como o “conto dos dois irmãos” - mostram a existência de pequenos proprietários, sobre os quais pouco sabemos. Em certos casos se trata, de fato, de arrendatários, os quais adquiriram, porém, o direito de transmitir por herança ou mesmo de vender suas parcelas. Nos períodos de decadência do poder monárquico, as aristocracias provinciais constituíram propriedades privadas extensas à margem de qualquer controle, sendo tal situação anulada ao restabelecer-se o governo centralizado.

A base da mão-de-obra do antigo Egito eram os camponeses, maioria absoluta da população. Viviam em aldeias, pagavam impostos ao Estado (em certos casos, a um templo ou senhor que gozasse de imunidade fiscal) em forma de cereais, linho, gado e outros produtos, e também se prestavam a corvéias ou trabalhos forçados, a nível local (obras de irrigação) ou nas obras públicas. Qual o status de tais camponeses? Na falta de documentação suficiente a respeito, as opiniões divergem. Sabemos que, desde o III milênio, dividiam-se em equipes de cinco, por sua vez agrupadas em decúrias e centúrias, sob o comando de capatazes. Na sua maioria, provavelmente estivessem indissoluvelmente ligados à terra que cultiva vam, embora também haja sinais da existência de outros tipos de mão-de-obra rural (arrendatários, assalariados pagos em espécie, escravos estrangeiros). Afirma-se com freqüência que os camponeses formavam comunidades aldeãs. Alguns elementos apóiam, de fato, o caráter comunitário das aldeias: a responsabilidade solidária pelo tributo e pelas corvéias, a existência de assembléias aldeãs (zazat), a associação entre atividades agrícolas e artesanais que fazia de cada aldeia uma unidade praticamente autárquica. Dificilmente, porém, poderíamos imaginar tais comunidades como igualitárias. Sua administração estava dominada por “notáveis” locais (saru) que, ao que tudo indica, eram mais ricos do que os seus subordinados e mesmo, nos períodos mais recentes da história faraônica, deviam saber ler e escrever. A origem de tais assembléias e notáveis, porém, talvez remonte a instituições clânicas ou tribais. No Reino Novo há sinais de um reforço das famílias restritas relativamente às comunidades. Mas a verdade é que a agricultura irrigada, se considerarmos o nível técnico vigente, só poderia ser mantida mediante uma constante cooperação comunitária a nível local, de modo que não parece provável ter ocorrido uma total dissolução das comunidades aldeãs.

Além da mão-de-obra ocasional fornecida pelos camponeses na época da inundação, quando os trabalhos agrícolas se paralisavam, as obras públicas empregavam também trabalhadores permanentes, remunerados em espécie. A Arqueologia revelou verdadeiras “cidades operárias” (por exemplo, na necrópole tebana e em Tell el-Amarna). A escravidão teve certa importância econômica nas minas e pedreiras estatais e, no Reino Novo, também nas terras reais e dos templos. Houve igualmente tropas militares auxiliares constituídas de escravos, e existiram escravos domésticos, às vezes numerosos. A economia egípcia, no entanto, nunca foi “escravista” no sentido em que o foi a da Grécia clássica e helenística e a da Roma de fins da República e do Alto Império.

A sociedade do Egito antigo tinha, no vértice da hierarquia social, o rei, considerado um deus, o intermediário necessário entre seu povo e os outros deuses. Ao contrário dos demais egípcios, o monarca podia ter diversas esposas legítimas, além de numerosas concubinas. A família real (normalmente numerosa), os sacerdotes e funcionários de alta hierarquia, as grandes famílias provinciais, formavam uma aristocracia tendente à hereditariedade. Esta situação ainda estava em gestação no Reino Antigo quando, num Egito unificado surgido em virtude da conquista, as funções públicas — que na prática se confundiam com o serviço à pessoa do rei — eram a fonte direta e única do prestígio e da riqueza e o sacerdócio ainda não se constituíra em casta (de fato, até o Reino Novo não havia hierarquia sacerdotal a nível de todo o Egito, e sim sacerdócios locais). Durante o Primeiro Período Intermediário, as diversas nobrezas dos nomos ou províncias se tornaram independentes, e só quando (sob a XII dinastia, no Reino Médio) o poder real voltou a estar bem consolidado, pôde a Coroa optar por uma solução radical: a extinção de tal aristocracia local, com confisco de suas terras. No Reino Novo, uma verdadeira aristocracia hereditária de funcionários, sacerdotes e altos chefes militares cercava o rei e às vezes ameaçava seu poder. Há casos comprovados, embora esporádicos, de renovação dos quadros aristocráticos com pessoas de origem humilde, podendo em especial a carreira de escriba ou a militar abrir caminho à ascensão social; em geral, no entanto, tendia-se à constituição de verdadeiras castas hereditárias em todos os níveis do corpo social.

Numa situação social intermediária encontramos os numerosos escribas e outros funcionários inferiores, e os sacerdotes de menor hierarquia, além dos artesãos e artistas altamente especializados que estavam a serviço do rei, dos templos e da corte.

Na larga base da pirâmide social, formando a maioria absoluta da população, estavam os trabalhadores braçais, camponeses majoritariamente, analfabetos, submetidos a tributos e trabalhos forçados, à arbitrariedade e corrupção dos funcionários e mesmo a castigos físicos. Já vimos que entre eles os escravos eram uma pequena minoria. Tanto na agricultura quanto nas outras atividades, existiam níveis acusados de divisão do trabalho e especialização funcional. No entanto, a produtividade do trabalho era baixa, compensando-se tal fato, quando necessário, com a abundância de mão-de-obra garantida por uma população densa. Estas massas populares exploradas eram mantidas na submissão pela vigilância, pela repressão e por fatores ideológicos (em especial a crença no caráter divino da monarquia). Em certas ocasiões, porém, explodiram terríveis sublevações. A mais célebre se deu no Primeiro Período Intermediário, e segundo A. Moret teve forte influência na evolução subseqüente da situação das classes populares. Por outro lado, conhecemos um caso de greve dos operários da necrópole real em fins do Reino Novo, em virtude do atraso na entrega de suas rações de alimentos. A civilização egípcia antiga desenvolveu-se no nordeste africano (margens do rio Nilo) entre 3200 a.C (unificação do norte e sul) a 32 a.c (domínio romano).

Como a região era desértica, o rio Nilo ganhou uma extrema importância para os egípcios. O rio era utilizado como via de transporte (através de barcos) de mercadorias e pessoas. As águas do rio Nilo também eram utilizadas para beber, pescar e fertilizar as margens, nas épocas de cheias, favorecendo a agricultura. A sociedade egípcia estava dividida em várias camadas, sendo que o faraó era a autoridade máxima, chegando a ser considerado um deus na Terra. Sacerdotes, militares e escribas (responsáveis pela escrita) também ganharam importância na sociedade. Esta era sustentada pelo trabalho e impostos pagos por camponeses, artesãos e pequenos comerciantes. Os escravos também compunham a sociedade egípcia e, geralmente, eram pessoas capturadas em guerras.Trabalhavam muito e nada recebiam por seu trabalho, apenas água e comida.

A economia egípcia era baseada principalmente na agricultura que era realizada, principalmente, nas margens férteis do rio Nilo. Os egípcios também praticavam o comércio de mercadorias e o artesanato. Os trabalhadores rurais eram constantemente convocados pelo faraó para prestarem algum tipo de trabalho em obras públicas (canais de irrigação, pirâmides, templos, diques).

A religião egípcia era repleta de mitos e crenças interessantes. Acreditavam na existência de vários deuses (muitos deles com corpo formado por parte de ser humano e parte de animal sagrado) que interferiam na vida das pessoas. As oferendas e festas em homenagem aos deuses eram muito realizadas e tinham como objetivo agradar aos seres superiores, deixando-os felizes para que ajudassem nas guerras, colheitas e momentos da vida. Cada cidade possuía deus protetor e templos religiosos em sua homenagem.Como acreditavam na vida após a morte, mumificavam os cadáveres dos faraós colocando-os em pirâmides, com o objetivo de preservar o corpo para a vida seguinte. Esta seria definida, segundo crenças egípcias, pelo deus Osíris em seu tribunal de julgamento. O coração era pesado pelo deus da morte, que mandava para uma vida na escuridão aqueles cujo órgão estava pesado (que tiveram uma vida de atitudes ruins) e para uma outra vida boa aqueles de coração leve. Muitos animais também eram considerados sagrados pelos egípcios, de acordo com as características que apresentavam: chacal (esperteza noturna), gato (agilidade), carneiro (reprodução), jacaré (agilidade nos rios e pântanos), serpente (poder de ataque), águia (capacidade de voar), escaravelho (ligado a ressurreição).


 A escrita egípcia também foi algo importante para este povo, pois permitiu a divulgação de idéias, comunicação e controle de impostos. Existiam duas formas de escrita: a demótica (mais simplificada) e a hieroglífica (mais complexa e formada por desenhos e símbolos). As paredes internas das pirâmides eram repletas de textos que falavam sobre a vida do faraó, rezas e mensagens para espantar possíveis saqueadores. Uma espécie de papel chamada papiro que era produzida a partir de uma planta de mesmo nome também era utilizado para escrever. A civilização egípcia destacou-se muito nas áreas de ciências. Desenvolveram conhecimentos importantes na área da matemática, usados na construção de pirâmides e templos. Na medicina, os procedimentos de mumificação, proporcionaram importantes conhecimentos sobre o funcionamento do corpo humano.

Pr. Sérgio Silva
Geografia e História


Nenhum comentário:

Postar um comentário